Cisma epistêmica, ferramenta do Oprimido


No Kenya colonial, Ngugi wa Thiong’o aponta o quanto as crianças sofriam diversos tipos de abuso para que abandonassem sua subjetividade, forjada na língua materna, e que aderissem às duras diretrizes da educação anglocêntrica (Thiong’o, 438). Esta universalização do pensamento, base do esquema de dominação das metrópoles, silencia violentamente um amplo léxico de linguagens e experiências.

 

Augusto Boal leva a visão crítica ao colonialismo para o campo da ação prática, propondo a experiência teatral como ferramenta para a abertura de uma brecha. Sua Poética do Oprimido propõe a ação do(a) espectador(a) como matéria política para a criação de um conhecimento não hierarquizado. O sujeito se torna agente do ato dramático e, a partir dele, surge a faísca da consciência sobre o valor da especificidade de seu contexto e história (Boal, 17).

 

O Teatro do Oprimido pode ser entendido como o exercício daquilo que Luiz Antonio Simas e Luiz Rufino classificam como uma cisma espistêmica (Rufino e Simas, 2018), um perpétuo movimento de desaprendizagem das normas do colonizador. Inspirados por Paulo Freire e por Exu – orixá tradutor e desobediente que habita no cruzamento dos caminhos – os autores defendem que somente através de uma educação que se configure como uma constante prática de liberdade (Freire, 90) e que traga o encantamento das múltiplas perspectivas, o “oprimido” pode subverter os grilhões do sistema, se livrando das amarras da colonização.

 

 

Rufino, Luiz, and LuizAntonio Simas. Fogo no mato - A ciência encantada das macumbas. Rio de Janeiro: Mórula Editorial, 2018. Freire, Paulo. Pedagoy of the Oppressed. New York: Continuum International Publisher, 2013. Boal, Augusto. Theatre of the Oppressed. London: Pluto Press, 2008. Ngugi, wa Thiong's. "The Language of African Literature" Colonial Dicourse and Post´-Colonial Theory, A Reader. Eds. Patrick Williams, and Laura Chrisman. New York: Columbia University Press, 1994. 435-455. Print.